O BDSM ainda é um tema envolto em estigmas, tanto na sociedade quanto dentro da própria comunidade de praticantes.
Muitas pessoas interessadas nessas dinâmicas evitam se identificar como parte do meio. Elas têm medo de discriminação ou internalizam preconceitos sobre suas próprias preferências.
No entanto, pesquisas indicam algo importante. Fazer parte de um grupo BDSM pode trazer benefícios significativos para a autoaceitação. Também melhora a segurança e o bem-estar emocional.
Um estudo recente conduzido por Samantha M. Maki, da Queen’s University, Canadá, investigou como o estigma internalizado afeta a identificação de indivíduos com grupos BDSM (2024).
Os resultados indicam que, para alguns praticantes, o estigma pode dificultar a aproximação com esses grupos. Para outros, pode aumentar o desejo de pertencer a eles como forma de buscar apoio e compreensão.

Índice
Metodologia do Estudo
O estudo de Maki foi conduzido com um total de 564 participantes. Eles foram recrutados por meio de fóruns online, redes sociais e contatos acadêmicos.
Os critérios de inclusão exigiam que os participantes tivessem pelo menos 18 anos. Eles precisavam ter algum grau de interesse em práticas BDSM. Não importava se eram praticantes ativos ou apenas curiosos.
Os participantes responderam a questionários estruturados que avaliavam:
- Nível de interesse em práticas BDSM, desde práticas mais comuns até as consideradas mais extremas;
- Grau de estigma internalizado, mensurado por uma escala adaptada de estudos sobre minorias sexuais;
- Identificação com a comunidade BDSM, analisando o quanto se sentiam pertencentes ou distantes desse grupo.
A análise estatística focou na relação entre estigma internalizado e identificação com o grupo BDSM. Ela identificou padrões que revelam como o estigma pode atuar como uma barreira.
E, por outro lado, também pode ser um fator de motivação para a conexão com essas comunidades.
O que é o estigma no BDSM e por que ele afasta algumas pessoas?
O estigma internalizado ocorre quando um indivíduo absorve crenças negativas sobre si mesmo. Ele reproduz essas crenças. Elas são originadas de um contexto social mais amplo.
No BDSM, isso pode levar algumas pessoas a:
- Sentirem vergonha ou culpa por seus desejos;
- Evitarem conversar sobre o tema, mesmo em espaços seguros;
- Resistirem a se identificar como parte de um grupo BDSM;
- Rejeitarem oportunidades de aprender sobre consentimento e segurança.
Segundo Maki, indivíduos interessados em práticas mais comuns, como vendagem e imobilização, tendem a experimentar um efeito negativo do estigma. Isso diminui sua identificação com grupos BDSM.
Em contrapartida, aqueles com interesse em práticas mais extremas, como impact play, needle play e outros podem sentir efeitos positivos. Ou seja, há um aumento no desejo de se conectar com outros praticantes.
Inclusive, outra pesquisa recente, aponta para esta característica. O BDSM em si traz benefícios ao bem-estar. O que dificulta é a relação com as outras pessoas. E também o medo de que as outras pessoas descubram o estilo de vida.
Como os grupos BDSM ajudam na autoaceitação e no bem-estar?
Fazer parte de um grupo BDSM pode transformar a experiência de quem tem interesse no tema. Isso ajuda na construção de uma identidade mais positiva. Isso ocorre porque esses grupos oferecem:
- Socialização e pertencimento: A conexão com outras pessoas que compartilham interesses semelhantes reduz o isolamento e promove a autoaceitação.
- Apoio emocional: Espaços seguros possibilitam que indivíduos discutam suas experiências sem medo de julgamento.
- Redução do impacto do estigma: Ao interagir com outros praticantes, muitos percebem que seus desejos não são incomuns ou problemáticos.
O estudo de Maki reforça que os grupos BDSM podem ser um fator de proteção contra o impactos negativos. Eles promovem bem-estar. Eles também facilitam o acesso a informações essenciais sobre práticas seguras.
O papel dos grupos BDSM na segurança e no consentimento
Além do suporte emocional, a participação em um grupo BDSM também favorece a educação sobre práticas seguras. Isso acontece por meio de:
- Workshops e eventos que ensinam sobre negociação, limites e palavras de segurança;
- Troca de experiências com praticantes mais experientes, que podem orientar sobre boas práticas;
- Divulgação de informações seguras, combatendo a desinformação sobre o tema.
Essas interações ajudam a garantir que práticas como “sexo bruto” não sejam confundidas com BDSM.
Elas também asseguram que os conceitos de SSC (São, Seguro e Consensual) sejam seguidos.
O papel do psicoterapeuta no acolhimento de praticantes BDSM
A psicoterapia desempenha um papel fundamental no suporte a indivíduos que lidam com o estigma e buscam maior autoaceitação. Um psicólogo bem-informado sobre BDSM pode:
- Oferecer um espaço livre de julgamento, permitindo que o paciente expresse suas vivências sem medo;
- Auxiliar no enfrentamento do estigma internalizado, ajudando a ressignificar crenças negativas;
- Orientar sobre dinâmicas de poder, limites e consentimento, garantindo um entendimento saudável das práticas BDSM;
- Validar a experiência do paciente. Mostre que seus desejos não representam uma patologia. Em vez disso, eles são uma forma de expressão da sexualidade.
Quando um terapeuta compreende as nuances do BDSM, ele cria um ambiente de confiança. Nesse ambiente, o paciente pode explorar suas emoções sem o receio de ser mal interpretado. Há também a ausência de estigmatização.
Como encontrar um grupo BDSM acolhedor?
Para quem deseja se conectar com um grupo BDSM, algumas opções incluem:
- Eventos locais e munches, que são encontros informais para quem quer conhecer praticantes sem pressão para participar de cenas BDSM.
- Fóruns e grupos online confiáveis, que oferecem espaços para troca de experiências.
- Workshops e palestras sobre BDSM, que ajudam a aprender sobre práticas seguras.
Caso a pessoa tenha receios devido ao estigma, pode ser útil procurar grupos com um enfoque educativo e progressivo.
Uma comunidade brasileira amplamente reconhecida no meio com essas características é o The Office.
Fazer parte de uma comunidade BDSM?
O estigma internalizado pode afastar muitas pessoas dos grupos BDSM. No entanto, esses espaços podem ser fundamentais para a autoaceitação. Eles também são importantes para a segurança e bem-estar.
Segundo o estudo de Maki, fazer parte de um grupo que compartilha interesses é importante. Respeitar os princípios do consentimento ajuda a reduzir a desinformação. Isso promove relações mais saudáveis, sejam elas BDSM ou não.
Aliás, sabe o que é curioso? Nos relacionamentos ditos normativos, o tema consentimento raramente ocorre. No BDSM, isso é o básico, sem o qual os acordos nem chegam a ocorrer. Consentimento é inegociável. Nesse caso, quem é patológico?
Referência
MAKI, Samantha M. Exploring the Impact of Internalized Stigma on Kink Group Identification in Individuals with Kink-related Interests. Queen’s University, 2024.
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