A busca pela autonomia autista é uma história que se repete continuamente na vida de muitas pessoas.
Lucas sempre soube que era diferente. Desde pequeno, sentia que o mundo ao seu redor se movia em um ritmo que não era o seu.
Diagnosticado com autismo na infância, cresceu cercado de expectativas alheias sobre quem deveria ser.
Na escola, os professores insistiam para que fosse “mais sociável”. Em casa, os pais queriam que ele se comportasse de maneira “mais apropriada”.
Mas o que Lucas queria? Essa pergunta raramente era feita a ele.

Índice
A vontade de tomar suas próprias decisões e se autodeterminar é legítima
Quando chegou a adolescência, ele expressou um desejo claro: queria ter um relacionamento.
Seus pais, preocupados, descartaram essa ideia rapidamente. Diziam que ele não estava pronto, que seria muito difícil para ele lidar com as emoções de uma relação.
Mas para Lucas, esse desejo era genuíno, algo que ele queria explorar e entender.
Foi assim que ele chegou ao consultório de uma psicóloga. Desde a primeira sessão, ela percebeu o dilema que ele enfrentava: sua autonomia estava sendo constantemente questionada.
Seus pais acreditavam estar protegendo-o, mas estavam, na verdade, tirando-lhe a chance de tomar decisões sobre sua própria vida.
Essa situação reflete um problema comum no tratamento de pessoas autistas. Há uma tendência a priorizar os desejos dos cuidadores.
Isso acontece em detrimento da vontade do próprio cliente.
Isso é muito frequente em abordagens medicalizantes em que o autista fica a mercê da vontade normalizadora de terapeutas neurotípicos.
Este tópico é abordado no artigo “The Ethical Imperative to Honor Autistic Clients’ Autonomy in Mental Health Treatment”.
O papel da autonomia autista
A autonomia é um princípio fundamental na ética da saúde mental.
Segundo o artigo, respeitar a capacidade de decisão do paciente leva a melhores resultados terapêuticos.
Isso aumenta o engajamento e a motivação para a terapia.
Entretanto, pessoas autistas frequentemente têm sua autonomia reduzida devido a estereótipos sobre suas capacidades.
A abordagem tradicional do tratamento muitas vezes coloca os cuidadores no centro da tomada de decisão. Essa abordagem ignora os desejos e perspectivas do próprio cliente autista.
Isso pode resultar em sentimentos de frustração e infantilização.
Há também uma sensação de falta de controle sobre a própria vida. Isso pode contribuir para questões como ansiedade e depressão.
Tomada de decisão compartilhada: um caminho para promover a autonomia autista
O modelo de tomada de decisão compartilhada é uma abordagem eficaz para promover a autonomia autista.
Ele garante que os desejos do cliente sejam respeitados. Isso acontece sem ignorar o papel da família e dos profissionais de saúde. Esse modelo propõe:
- Reconhecer que uma decisão precisa ser tomada. O primeiro passo é identificar os pontos de conflito entre o desejo do cliente e as expectativas da família.
- Estabelecer um diálogo igualitário. Tanto o cliente quanto seus cuidadores devem ser ouvidos, garantindo que as necessidades de todos sejam consideradas.
- Explorar opções. O profissional deve apresentar alternativas e explicar seus impactos, respeitando os valores e desejos do cliente.
- Negociar um plano viável. Encontrar soluções que promovam a autonomia do cliente sem desconsiderar suas necessidades de suporte.
- Acompanhar os resultados. O progresso deve ser monitorado, garantindo que o plano esteja realmente ajudando o cliente a se desenvolver.
Esse modelo é especialmente útil no tratamento de adolescentes autistas. Ele ajuda a reduzir conflitos com cuidadores. Também permite que o cliente desenvolva habilidades para tomar decisões importantes ao longo da vida.
Conclusão
Promover a autonomia autista na terapia não significa deixá-las sem suporte.
Isso significa reconhecer que elas têm o direito de participar ativamente das decisões que afetam suas vidas.
Profissionais de saúde mental devem estar atentos aos vieses que podem influenciar suas práticas. Eles devem buscar metodologias que incentivem o protagonismo do cliente.
A história de Lucas ilustra uma realidade vivida por muitas pessoas autistas.
O profissional da Psicologia precisa buscar que cada indivíduo tenha seu direito de escolha respeitado. A ideia é favorecer, dentro do possível, um ambiente terapêutico que favoreça o crescimento e a autodeterminação.
Bibliografia
MCVEY, Alana J.; GLAVES, Katherine Jo; SEAVER, Samantha; CASAGRANDE, Karís A. The ethical imperative to honor autistic clients’ autonomy in mental health treatment. Frontiers in Psychiatry, v. 14, p. 1259025, 2023.
Descubra mais sobre Psicólogo Online e Presencial em Curitiba
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.