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“Gente feia” se dá bem no tribunal?

    Será que a aparência influencia os julgamentos de culpa em tribunais? Um estudo publicado na revista Psychiatry, Psychology and Law revelou um fenômeno curioso. “Gente feia” tende a ser julgada como mais inocentes em determinados contextos.

    Esse fenômeno foi chamado de efeito da leniência dos feios (ugly leniency effect).

    Usamos o termo “gente feia” entre aspas porque sabemos que os padrões de beleza são culturais e subjetivos. No entanto, esse é um termo amplamente usado e ajuda a tornar a discussão mais acessível. Como bem sabemos, julgar os outros pela aparência, isso sim, é sinônimo de feiura.

    O estudo não sugere que a beleza (ou a falta dela) seja um critério legítimo de julgamento. Justamente o contrário, destaca que nossos vieses inconscientes podem afetar decisões que deveriam ser imparciais.

    O artigo original está disponível apenas para assinantes. Tentamos acessá-lo pelo Sci-Hub. Este é um repositório de artigos acadêmicos que permite o acesso gratuito a publicações científicas.

    No entanto, por ser um estudo recente, não estava disponível lá. Como alternativa, utilizamos o artigo do PsyPost para trazer os principais achados da .

    Gente feia pode se dar bem no tribunal: padrões de beleza são culturais mais influenciam as decisões na corte de justiça?

    O estudo e seus objetivos

    Os pesquisadores analisaram como a atratividade e a confiabilidade facial afetam julgamentos intuitivos de culpa.

    Para isso, recrutaram 128 participantes, que atuaram como juízes em um caso simulado de golpe em um encontro às cegas.

    Cada participante avaliou nove rostos masculinos, divididos em três categorias de atratividade: atraente, neutro e pouco atraente.

    Todos os rostos apresentavam um nível médio de confiabilidade, para evitar que esse fator influenciasse os resultados.

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    Os participantes foram divididos em dois grupos.

    ✔️ Um grupo tomou decisões sob pressão de tempo.

    ✔️ Outro grupo pôde refletir com calma antes de decidir.

    O estudo também avaliou se os participantes tendiam a pensar de forma mais racional ou intuitiva, usando o Inventário Racional-Experiencial.

    Principais descobertas

    🟢 Pessoas consideradas “gente feia” foram julgadas como inocentes com mais frequência do que pessoas neutras ou atraentes.

    🟢 O tempo para julgamento não alterou os resultados. Isso significa que o efeito da leniência sobre “gente feia” aconteceu sob pressão. O mesmo efeito também ocorreu sem pressão.

    🟢 O estilo de pensamento (racional ou intuitivo) não influenciou a tendência de considerar rostos menos atraentes como inocentes.

    🟢 Os participantes reconheceram que a aparência pode influenciar a percepção de culpa. Isso ocorre mesmo sem a intenção de julgar de forma enviesada.

    O motivo para esse fenômeno pode estar na forma como associamos a atratividade à credibilidade. Em crimes como golpes românticos, pessoas atraentes podem ser vistas como mais propensas a se beneficiarem da própria aparência.

    As menos atraentes não evocam essa mesma percepção.

    O que isso significa para o sistema jurídico?

    Embora os tribunais busquem a imparcialidade, esse estudo mostra que julgamentos ainda são influenciados por viés inconsciente.

    Isso levanta uma questão importante: até que ponto fatores irrelevantes, como a aparência, afetam decisões judiciais?

    Esse efeito desafia a ideia de que pessoas atraentes sempre recebem um tratamento mais favorável. Dependendo do contexto, a atratividade pode prejudicar um réu, enquanto rostos menos atraentes podem ganhar o benefício da dúvida.

    Limitações do estudo e direções futuras

    🔹 O estudo focou em um único tipo de crime. Esse foi um golpe amoroso. Isso pode limitar a aplicação dos resultados a outros delitos.

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    🔹 Apenas rostos masculinos foram analisados. O efeito ocorreria da mesma forma para mulheres?

    🔹 Novas pesquisas podem explorar como esse viés funciona em diferentes culturas. Também podem verificar se ele se aplica a crimes mais graves.

    Conclusão

    Se a aparência pode afetar nossos julgamentos de forma tão automática, que outros fatores inconscientes podem estar moldando nossas decisões?

    Esse estudo reforça a importância de minimizar vieses no sistema judicial, garantindo julgamentos mais justos e imparciais.

    Referência

    OLIVERA-LA ROSA, Antonio; AYALA, Luis D.; TAMAYO, Ricardo M. When being unattractive is an advantage: effects of face perception on intuitive culpability judgments. Psychiatry, Psychology and Law, v. 31, n. 6, p. 1114-1130, 2024. DOI: 10.1080/13218719.2023.2260847.


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