Não é só o seu feed de notícias que mudou. A forma como a desinformação circula por ele também mudou. Um estudo recente publicado na PNAS Nexus revelou algo importante.
A inteligência artificial generativa já está sendo usada em campanhas de propaganda política de forma eficaz. Isso ocorre sem perder credibilidade aos olhos de quem lê.
Esse achado coloca uma pulga atrás da orelha. Será que conseguimos mesmo distinguir uma notícia falsa gerada por IA de uma escrita por humanos?

Índice
O caso DC Weekly: desinformação com aparência de jornalismo
A pesquisa analisou o site DC Weekly, um portal aparentemente americano, mas ligado a operações de influência do governo russo. Inicialmente, o site apenas copiava e colava textos de outras fontes.
Mas, a partir de setembro de 2023, tudo mudou. Textos originais começaram a aparecer. Eles têm estruturas e frases típicas de modelos como o GPT-3.
O mais curioso? A partir do uso da IA, o número de artigos publicados por dia mais que dobrou. A variedade de temas abordados também aumentou consideravelmente.
Isso foi possível sem perder o tom “profissional”. Mais preocupante ainda, não afetou a credibilidade percebida pelo público. Isso ocorreu apesar de a campanha visar a desinformação.
Mais volume, mais temas, mesma credibilidade
Ao analisar quase 23 mil textos publicados entre abril e novembro de 2023, os pesquisadores constataram que:
- A produção aumentou 2,4 vezes após o uso da IA.
- O número de temas abordados (de política internacional a violência doméstica) praticamente dobrou.
- Um experimento com 880 adultos norte-americanos foi realizado. O resultado mostrou que os textos gerados com IA foram considerados tão críveis quanto os anteriores. Eles também foram vistos como persuasivos.
Ou seja, a IA não só escreve mais rápido, como convence com a mesma eficiência.
Não é só escrever: a IA também decide o que escrever
Outro ponto importante do estudo foi mostrar que a IA não era usada apenas para redigir os textos. Ela também ajudava a escolher os temas e o tom ideológico de cada artigo.
Alguns comandos vazados indicavam instruções específicas. Entre elas estavam: “adote um tom cínico ao falar do governo dos EUA” e “favoreça a imagem de políticos republicanos”.
A IA estava sendo usada para escolher, moldar e reescrever as narrativas de forma estratégica.
O que isso tem a ver com Psicologia?
Pode parecer que estamos falando de geopolítica ou tecnologia, mas este é, também, um tema profundamente psicológico.
Quando um conteúdo é lido e interpretado como verdadeiro, ele molda crenças, emoções e comportamentos.
A manipulação da informação afeta diretamente a forma como construímos nossas opiniões. Ela também influencia o modo como reagimos ao mundo e como nos relacionamos com os outros.
Isso nos leva a uma pergunta importante:
Como nos protegemos de uma mentira que parece verdadeira?
Vigilância crítica e alfabetização digital
A resposta talvez não esteja apenas em combater a IA. Precisamos também fortalecer nossa própria capacidade de ler o mundo com atenção. Temos que ter curiosidade. Isso passa por:
- Desenvolver senso crítico.
- Duvidar de conteúdos que reforçam visões extremas.
- Buscar fontes confiáveis.
- Estimular a leitura lenta e reflexiva.
Mais do que nunca, precisamos desacelerar diante do excesso de informações.
Como num relacionamento abusivo, é a sedução do discurso que nos aprisiona.
E a IA, nesse cenário, pode ser uma ferramenta que potencializa esse encantamento manipulador.
IA: ferramenta neutra ou cúmplice do engano?
A inteligência artificial, por si só, não tem intenção. Ela repete, amplia, adapta.
O problema começa quando seu uso ocorre por motivos ocultos.
Isso é especialmente verdadeiro quando os resultados dessa manipulação se tornam invisíveis até para quem consome a mentira.
Você já se perguntou quantas das suas opiniões nasceram de conteúdos cuidadosamente moldados por algoritmos?
Referência
WACK, M. et al. Generative propaganda: Evidence of AI’s impact from a state-backed disinformation campaign. PNAS Nexus, v. 4, pgaf083, 2025.
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