Pode parecer estranho, mas há uma ligação entre álcool e peso corporal que vai muito além da contagem de calorias.
O uso problemático de álcool, também conhecido como transtorno do uso de álcool (AUD), tem origens genéticas e cerebrais. E o índice de massa corporal (IMC) compartilha essas mesmas origens.
Álcool e peso não parecem se relacionar à primeira vista. Afinal, pessoas com problemas com álcool não são necessariamente obesas.
No entanto, os cientistas encontraram mais de 80% de sobreposição genética entre os dois fatores.
Como isso é possível?
Índice

O mesmo gene pode puxar para lados opostos
Imagine um maestro que rege duas orquestras ao mesmo tempo. Algumas notas são iguais, mas o efeito final pode ser totalmente diferente. Foi isso que os pesquisadores descobriram.
Muitos genes que afetam o uso de álcool também afetam o peso. Contudo, eles frequentemente agem em sentidos opostos.
Isso quer dizer que um mesmo gene pode aumentar a chance de uma pessoa desenvolver o uso problemático de álcool. Ao mesmo tempo, pode diminuir o peso corporal — ou o contrário.
Por isso, mesmo com tanta semelhança genética, a correlação estatística entre álcool e IMC parece quase nula.
O cérebro no centro da história
O estudo também investigou estruturas cerebrais ligadas a essas condições. Duas áreas ganharam destaque: a amígdala e o núcleo caudado.
A amígdala cerebral é uma região que ajuda a detectar ameaças. Ela processa emoções fortes. Também regula o medo e a ansiedade.
Já o núcleo caudado é parte de um sistema que nos motiva. Ele regula recompensas e está ligado ao controle de impulsos.
Essas áreas são como “postos de controle emocional” e “centros de recompensa”.
Alterações nelas podem influenciar o desejo por álcool. Isso também afeta a forma como o corpo regula o apetite e o acúmulo de gordura.
Emoção, corpo e escolhas
O estudo também aponta que muitas das variantes genéticas são compartilhadas entre álcool e peso. Elas estão associadas à expressão gênica no cérebro.
Isso ocorre principalmente em áreas envolvidas com regulação do comportamento e tomada de decisão.
Isso indica que fatores biológicos ligados ao controle da recompensa afetam o apetite. Eles também impactam a impulsividade e o consumo de álcool.
Além disso, os achados sugerem que estratégias de prevenção e cuidado poderiam considerar essa sobreposição.
Em vez de tratar esses temas separadamente, talvez seja mais eficaz ver esses temas como manifestações diferentes. Eles são de um mesmo sistema vulnerável ao desequilíbrio emocional e neurológico.
O estudo reforça uma ideia que já aparece na clínica: nossas emoções moram no corpo. Muitas vezes, aquilo que chamamos de “falta de força de vontade” é, na verdade, parte de um sistema inteiro.
Este sistema é genético, emocional e cerebral. Ele puxa para um lado.
Quantas vezes você já se viu comendo demais para aliviar a tensão? Ou bebendo para “esquecer dos problemas”?
A ciência mostra que essas escolhas têm raízes mais profundas. Elas envolvem tanto a história de vida quanto a biologia individual.
Para pensar…
Se emoções, genes e impulsos agem juntos, como podemos cuidar melhor de nós mesmxs sem cair na culpa? Que espaços precisamos construir para olhar para o corpo e para os desejos sem julgamento?
Talvez o primeiro passo seja reconhecer que o corpo fala. Escutar o que ele está tentando dizer pode ser o início de uma transformação.
Referência
MALONE, Samantha G. et al. Alcohol use disorder and body mass index show genetic pleiotropy and shared neural associations. Nature Human Behaviour, [S. l.], 2025.
Descubra mais sobre Psicólogo Online e Presencial em Curitiba
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.